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Danos morais em negativas de planos de saúde como tema de uniformização no Judiciário

Fábio Fonseca Pimentel Foto: Divulgação/M2 Comunicação

*Por Fábio Fonseca Pimentel

Tribunal suspendeu recursos e prepara precedente vinculante que terá impacto direto para consumidores e operadoras

A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de afetar o Recurso Especial nº 2197574 – SP ao rito dos recursos repetitivos marca um ponto crucial na discussão sobre o cabimento de indenização por danos morais “in re ipsa” nas hipóteses de recusa indevida de cobertura médico-assistencial por operadoras de planos de saúde. A medida, definida por unanimidade em recente julgamento pela Segunda Seção do STJ – sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva -, sinaliza a necessidade de uniformização de entendimento em matéria de vasto impacto social e jurídico.

A questão jurídica a ser dirimida é clara e objetiva: “definir se há configuração de danos morais ‘in re ipsa’ nas hipóteses de recusa indevida de cobertura médico-assistencial pela operadora de plano de saúde”. O conceito de “dano moral in re ipsa” refere-se aquele dano que se presume pela simples ocorrência do ato ilícito, prescindindo de prova da efetiva repercussão na esfera do indivíduo.

Tradicionalmente, a recusa indevida de cobertura por um plano de saúde tem sido frequentemente enquadrada como hipótese de dano moral presumido, dada a natureza essencial do bem tutelado – a saúde e a vida. No entanto, a jurisprudência do STJ tem apresentado divergências consideráveis entre suas turmas, gerando incerteza e decisões díspares, o que corretamente motivou a afetação do tema.

A decisão de afetar o tema já produz efeitos imediatos e trará consequências significativas, independentemente do resultado final do julgamento de mérito.

Com a afetação, o STJ “determinou a suspensão dos recursos especiais ou agravos em recursos especiais em segunda instância e/ou no STJ, cujos objetos coincidam com o da matéria afetada”. Esta medida visa evitar o prosseguimento de múltiplos casos idênticos que poderiam gerar decisões conflitantes antes de uma posição final da Corte Superior.

Um dos principais objetivos da afetação é proporcionar “maior segurança jurídica aos interessados, além de evitar decisões díspares nas instâncias ordinárias”, conforme expresso no relatório. Ao estabelecer um precedente vinculante, o STJ garantirá que casos semelhantes sejam julgados da mesma forma em todo o território nacional, promovendo a isonomia e a previsibilidade nas relações entre consumidores e operadoras de saúde.

Essas ferramentas processuais permitirão um tratamento mais ágil e uniforme dos litígios que versem sobre a matéria afetada, reduzindo o acúmulo de processos nas diversas instâncias.

Para os beneficiários, os consumidores, a decisão final terá um peso significativo. Se o STJ decidir que a recusa indevida, por si só, não configura dano moral presumido, os consumidores precisarão comprovar o efetivo abalo psicológico ou o agravamento da condição de saúde para obterem indenização por danos morais.

Por outro lado, se a Corte reafirmar a presunção, a proteção ao consumidor será robustecida. A expectativa é que o precedente traga clareza sobre o ônus da prova e os requisitos para a indenização.

As operadoras, obviamente, aguardam com interesse a decisão final. Uma definição que afaste a presunção de dano moral em casos de recusa indevida pode significar uma redução na quantidade e nos valores das condenações por danos morais. No entanto, importante lembrar, que a exigência de comprovação não as isenta da responsabilidade em casos de recusa manifestamente abusiva ou que causem comprovado e grave prejuízo ao beneficiário.

A afetação deste tema pelo STJ é uma medida correta e necessária. Embora a tendência apontada pelos precedentes citados no relatório sugira uma inclinação para afastar o dano moral presumido em muitos cenários, exigindo a comprovação do abalo, é indiscutível que a recusa indevida de um tratamento médico pode gerar angústia, desespero e abalo emocional.

Por outro lado, a presunção absoluta pode levar a banalização do instituto do dano moral e a indenizações sem a devida correspondência com a extensão do sofrimento.

O desafio do STJ, portanto, será encontrar um ponto de equilíbrio que coíba abusos por parte das operadoras e, ao mesmo tempo, não desvirtue a natureza do dano moral, que deve refletir uma lesão real aos direitos da personalidade.

Fábio Fonseca Pimentel, sócio do Comparato, Nunes, Federici &Pimentel Advogados (CNFLaw) na área de Contencioso Cível e Resolução de Disputas

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