*por Eduardo Batista
Vivemos a era dos “filhos únicos digitais”. Não importa se a criança tem irmãos ou colegas na escola: cada vez mais, ela cresce sozinha em seu próprio universo virtual, alimentado por algoritmos que moldam gostos, opiniões e comportamentos. Em silêncio, formamos uma geração com baixa convivência real, alta exposição digital e empobrecimento do convívio coletivo.
Antes, filhos únicos eram exceção. Hoje, mesmo em famílias numerosas, cada filho habita uma bolha digital distinta. Um assiste vídeos infantis com sotaque britânico, outro se vicia em jogos com estímulos frenéticos, outro aprende política com influenciadores extremistas. Todos sob o mesmo teto, mas em quartos mentais separados.
Essa segmentação extrema não é só questão de entretenimento: ela afeta a formação emocional e social. A convivência é um exercício fundamental de cidadania. Crianças que não aprendem a negociar brinquedos terão dificuldade em negociar ideias. Adolescentes que não compartilham experiências comuns terão pouco vocabulário para sustentar laços afetivos ou políticos.
O problema é amplificado pela ilusão de que esses jovens são “superconectados”. Estão, sim, conectados a redes, mas não entre si. A hiperpersonalização do conteúdo digital isola em vez de integrar. E o tempo de tela substitui o tempo de conflito produtivo, ou seja, aquele que ensina empatia, limites e escuta.
A escola, que poderia ser um espaço de convivência e pluralidade, muitas vezes replica essa lógica de individualização digital. Tablets em sala de aula viraram uma solução genérica, sem que se pense no que se está perdendo. No lugar da roda de conversa, a gamificação. No lugar do debate, quizzes automatizados.
Responsabilizar apenas os pais é cômodo e insuficiente. Plataformas digitais lucram com esse isolamento: quanto mais tempo cada jovem passa sozinho na frente da tela, mais dados são gerados, mais anúncios são clicados, mais previsível se torna seu comportamento. O isolamento virou modelo de negócio. Precisamos urgentemente devolver a experiência do comum às novas gerações. Isso significa criar políticas públicas que incentivem a convivência real em escolas, praças, bibliotecas, esportes coletivos e, repensar o papel das tecnologias no cotidiano infantil.
Mais do que regulamentar redes sociais, é preciso recuperar o valor da convivência. A criança que aprende a dividir um brinquedo hoje é a mesma que saberá conviver com a diferença amanhã. A democracia também começa no quintal, mas ele está vazio.
*Eduardo Batista é coordenador dos cursos de História e Sociologia da EAD UniCesumar. Possui graduação em licenciatura em Filosofia pela PUC; Graduação em bacharelado em Teologia pela PUC; Graduação em Pedagogia pela UNIFATECIE. Mestrado em Teologia PUC e, atualmente doutorando em Teologia Pastoral PUC-RIO. Atua como professor na pós-graduação das Faculdades Vicentina e Instituto Paranaense. Escritor de diversos artigos sobre análises de conjunta social e atualmente atua como coordenador dos cursos de graduação EAD da UniCesumar, marca do Grupo Vitru Educação, na disciplina de Licenciatura em Filosofia, História, Sociologia e Geografia.