Da Redação
A nova embarcação, Oyvon, foi reformada e equipada para resgatar os sobreviventes que cruzam uma das rotas migratórias mais mortais do mundo
A organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) anunciou hoje (12/11), a retomada de suas atividades de busca e salvamento no mar Mediterrâneo central, quase um ano após ter sido forçada a encerrar as operações.
MSF está lançando seu novo navio de resgate, Oyvon, que significa “esperança para a ilha” em norueguês. A embarcação foi reformada e equipada para realizar salvamentos em uma das rotas migratórias mais mortais do mundo. O Oyvon foi anteriormente utilizado como navio-ambulância na Noruega.
“Como uma organização médica e humanitária, nosso compromisso de estar presente no mar e apoiar as pessoas em movimento é inabalável”, afirma Juan Matias Gil, representante das operações de resgaste e salvamento de MSF. “Voltamos para cumprir o dever de resgatar aqueles que se encontram em perigo no mar — pessoas forçadas a pegar botes e embarcações que não estão em condições de navegar, após terem enfrentado condições deploráveis e desumanas, detenção arbitrária, abuso e extorsões na Líbia.”
Políticas restritivas tornaram os trabalhos de busca e salvamento quase impossíveis
A organização foi forçada a interromper as atividades de resgate com seu navio anterior, o Geo Barents, em dezembro de 2024, após mais de dois anos operando sob leis e políticas italianas restritivas, principalmente, o Decreto Piantedosi e a prática de desembarque de sobreviventes em portos distantes. Essas regras tornaram inviável o trabalho do Geo Barents, que, apesar de capacidade para até 700 pessoas a bordo, era rotineiramente direcionado a portos distantes, transportando apenas cerca de 50 sobreviventes.
“A decisão de MSF de enviar uma embarcação menor e mais rápida é uma resposta estratégica às leis e práticas restritivas e obstrutivas impostas pelo governo italiano, que visa especificamente embarcações de resgate humanitário”, acrescenta Gil.
Ao retornar ao Mediterrâneo Central, MSF também pretende relatar e documentar as experiências de pessoas que fogem da Líbia, reunindo seus testemunhos sobre as interceptações violentas no mar realizadas pela Guarda Costeira Líbia e por outros atores. A organização também buscará registrar os casos de retorno forçado à Líbia, prática reconhecida pelos tribunais italianos e por órgãos das Nações Unidas como violação do direito marítimo internacional, dos direitos humanos e do direito dos refugiados.
Nos últimos meses, houve um aumento nos ataques violentos em águas internacionais cometidos pela Guarda Costeira da Líbia e por outros grupos armados contra pessoas que cruzam o Mediterrâneo. As embarcações de resgate humanitário também foram alvos dessas ações.
A tripulação de MSF a bordo do Oyvon inclui um médico e uma enfermeira para fornecer cuidados médicos em situações de risco de vida e tratar pessoas com hipotermia, inalação de combustível, queimaduras, bem como ferimentos que possam ter sofrido no ciclo de abuso e detenção na Líbia.
Notas para o editor:
O Mediterrâneo Central continua sendo uma das rotas de migração mais mortais do mundo, de acordo com a Agência das Nações Unidas para a Migração (OIM)[1], pelo menos 25.630 homens, mulheres e crianças morreram ou desapareceram neste trecho do mar desde 2014. Desse total, 1.810 somente em 2024. Isso significa que, em média, 5 pessoas morreram todos os dias, tornando 2024 o segundo ano mais mortal já registrado desde 2017.
MSF participa ativamente das atividades de busca e resgate no Mediterrâneo Central desde 2015, trabalhando em nove embarcações de resgate diferentes (sozinha ou em parceria com outras ONGs) e já resgatou mais de 94.200 pessoas.
Em janeiro de 2023, o Decreto Piantedosi (Decreto-Lei nº 1/2023) introduziu na Itália um novo conjunto de regras aplicáveis exclusivamente a embarcações de resgate civis, além de prever sanções pelo descumprimento dessas normas, que variam de 10 a 20 dias de detenção no porto até o confisco da embarcação.
Desde a implementação do punitivo Decreto Piantedosi, o Geo Barents foi penalizado quatro vezes, totalizando 160 dias de detenção. Entre dezembro de 2022 e dezembro de 2024, essas medidas obstrutivas também forçaram o navio a percorrer 64.966 quilômetros adicionais e permanecer 163 dias a mais no mar para chegar a portos distantes, no norte da Itália, a fim de desembarcar os sobreviventes resgatados — em vez de fazê-lo em portos mais próximos, no sul.
[1] https://missingmigrants.iom.int
