Da Redação
Projeto liderado pelo maestro baiano Ricardo Castro concretiza o sonho da primeira grande orquestra angolana e inaugura uma nova era para a música sinfônica na África lusófona
Sob a liderança do maestro e pianista Ricardo Castro, fundador e diretor-geral do NEOJIBA, Angola acaba de viver um marco histórico: a criação e estreia da Orquestra do Cinquentenário, sua primeira grande orquestra sinfônica, formada por 130 jovens músicos e técnicos angolanos.
O concerto inaugural, realizado em 7 de novembro de 2025, no Centro de Convenções de Belas, em Luanda, marcou o início das comemorações oficiais dos 50 anos de independência do país. O evento, televisionado em rede nacional, foi recebido com entusiasmo pelo público e pela crítica, consolidando a nova orquestra como símbolo de um futuro promissor para a música angolana.
Do sonho à realidade
O projeto nasceu de uma iniciativa da primeira-dama de Angola, Ana Dias Lourenço, que desejava ver o país dotado de uma instituição musical de excelência. “Ela acreditava que o país merece ter uma grande orquestra feita com e para a juventude”, recorda Ricardo Castro.
A partir desse ideal, e depois de muitas tentativas infrutuosas, o maestro baiano foi convidado a conceber e liderar a metodologia de implantação, inspirada no modelo do NEOJIBA – Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia, reconhecido mundialmente por aliar excelência artística e transformação social.
O projeto foi lançado pela iniciativa de empresas e patrocinadores locais e contou com o apoio dos Ministérios da Educação e da Cultura de Angola, que disponibilizaram o CEARTE – Centro de Artes e Ofícios de Luanda como sede.
Após duas grandes audições nacionais, mais de 330 jovens se candidataram às vagas. Foram selecionados 118 instrumentistas e 12 técnicos, que, desde março, participaram de um processo intensivo de formação conduzido por professores do Brasil e da Europa.
Foram adquiridos instrumentos até então inexistentes no país — como oboés, fagotes e trompas —, e criado um ateliê-escola de luteria, garantindo a manutenção e autonomia técnica da nova estrutura. A formação incluiu ainda arquivistas, inspetores, produtores e líderes de naipe angolanos, que hoje compõem o núcleo profissional da orquestra.
Estreia histórica e afirmação cultural
O concerto inaugural, regido por Ricardo Castro, apresentou um programa dedicado à liberdade e à juventude angolana, com obras de Rui Mingas, Villa-Lobos, Lorenzo Fernandes, Francisco Mignone, Bizet, Beethoven, Tchaikovsky e Sibelius, além de uma Rapsódia Angolana sobre temas angolanos criada especialmente para a ocasião pelo compositor Jamberê, integrante do NEOJIBA.
Quatro dias depois, no 11 de novembro, data oficial do Cinquentenário da Independência, a orquestra participou da cerimônia no Memorial Dr. Agostinho Neto, executando sob a regência de Ricardo Castro e com participação do tenor angolano Emanuel Mendes, o Hino Nacional de Angola — apresentado, pela primeira vez, por uma orquestra sinfônica integralmente angolana.
O impacto foi imediato. Em poucos dias, a Orquestra do Cinquentenário se tornou símbolo de orgulho e esperança para o país, amplamente celebrada pela imprensa e pela população.
“É comovente ver a música sinfônica vibrar em Angola com tanta força e qualidade. O potencial da juventude angolana é fenomenal”, afirmou Ricardo Castro. “O que nasceu aqui é mais do que uma orquestra — é um símbolo de união, orgulho e futuro para a África.”
Compromisso do Governo e continuidade
Diante do sucesso artístico e institucional do projeto, o Governo de Angola anunciou que manterá a Orquestra do Cinquentenário em atividade contínua, garantindo a sua estrutura e funcionamento até a criação da Orquestra Nacional de Angola, que seguirá os melhores padrões internacionais de formação, gestão e excelência artística.
A nova orquestra passa, assim, a representar o embrião da futura Orquestra Nacional, com programação regular e um plano de desenvolvimento de longo prazo coordenado por Ricardo Castro e sua equipe.
Um legado que ressoa entre África e Brasil
Mais do que um acontecimento artístico, a criação da Orquestra do Cinquentenário representa um ato de devolução cultural. O projeto reafirma a ligação profunda entre Brasil e Angola, conectando dois povos unidos por séculos de história e agora reencontrados através da música.
A realização também reacende um debate caro à trajetória de Ricardo Castro. Muitas vezes mal interpretado ao defender que as orquestras devem concentrar-se em repertórios e formações que demandem seu potencial completo, o maestro vê em Angola a confirmação prática de sua visão: orquestras não são luxo, mas instrumentos de emancipação — quando bem estruturadas e colocadas a serviço da formação e do desenvolvimento humano.
“Em Angola, a música sinfônica não é importação europeia. É conquista africana”, afirma. “Aqui, a orquestra não toca para elites, mas para o povo — e nasce com a missão de educar, inspirar e unir.”
