*Por Paulo Larazi, CEO da Recrutei
O desaparecimento de candidatos durante processos seletivos, conhecido como ghosting reverso, tem crescido. Isso revela mais sobre as falhas das empresas do que sobre a postura dos profissionais. Embora muitos ainda vejam essa desistência repentina como falta de comprometimento, essa visão ignora o contexto atual do mercado. Hoje, o equilíbrio entre empresas e talentos está mudando. Candidatos qualificados têm mais opções e estão mais seletivos. Essa atitude dos candidatos é uma resposta natural às novas dinâmicas do mercado.
Participar de um processo seletivo exige tempo, energia emocional e, muitas vezes, adaptações na rotina. Quando a experiência oferecida pela empresa não demonstra o mesmo nível de comprometimento, é natural que o candidato reavalie sua permanência. Processos longos, repletos de etapas pouco objetivas, sem retorno claro ou com comunicação ineficiente são percebidos como sinal de desorganização.
Segundo um estudo da Glassdoor, processos com mais de quatro etapas têm 20% mais chances de serem abandonados. A mensagem implícita é clara: se a entrada na empresa já é desgastante, isso reflete diretamente na experiência do colaborador ao longo do tempo. Outro dado que merece atenção vem do relatório Candidate Experience Benchmark Research, da Talent Board. Mais de 52% dos candidatos afirmam que nunca recebem feedback após entrevistas. Essa ausência de retorno não é apenas uma falha de comunicação; é uma quebra de confiança que afeta diretamente a percepção sobre a empresa.
Em um cenário de competição por talentos, deixar candidatos sem qualquer resposta é uma escolha arriscada, que pode comprometer a reputação da marca empregadora. Prova disso é que 72% dos candidatos compartilham experiências negativas com amigos ou nas redes quando se sentem mal tratados durante a seleção, como mostra levantamento da AIHR. Mesmo assim, ainda são comuns as queixas de recrutadores frustrados com o sumiço de candidatos, sem que se avaliem com profundidade os motivos por trás desse comportamento. O abandono não acontece por acaso. Ele é uma resposta a uma jornada seletiva que não valoriza quem participa dela. É um sinal de alerta e deve ser interpretado como tal.
Responsabilizar o candidato pela evasão é uma forma simplista de lidar com um problema complexo. Reduzir o ghosting reverso exige mais do que mensagens automáticas ou cobranças por mais comprometimento. Requer profissionalismo, empatia e organização. Um processo bem estruturado, com etapas necessárias e bem explicadas, comunicação ágil e humanizada e retorno consistente é hoje um diferencial competitivo. Recrutar talentos é também construir vínculos, e vínculos só se sustentam com respeito mútuo.
Sendo assim, empresas que desejam atrair e reter os melhores profissionais precisam encarar o processo seletivo como parte da sua identidade e cultura. Quando um candidato desiste, ele está enviando uma mensagem importante: algo naquela experiência não fez sentido. Ouvir esse sinal e reavaliar a própria abordagem pode ser o primeiro passo para construir uma relação mais equilibrada, eficiente e, acima de tudo, humana com o mercado de trabalho.
*Paulo Lazari é CEO e fundador da Recrutei, software de recrutamento e seleção.